Viaturas atribuídas, através de acordo escrito, a trabalhadores e membros dos órgãos sociais das empresas
O regime aplicável às viaturas atribuídas, através de acordo escrito, a trabalhadores e membros dos órgãos sociais das empresas, para utilização pessoal, está em vigor há mais de uma década.
A partir de 2014 a sua aplicação prática começou a ser mais ponderada, em virtude do forte incremento das taxas de tributação autónoma relacionadas com viaturas ligeiras de passageiros que ocorreu com a reforma do IRC, bem como a Lei do Orçamento do Estado para 2014.
É que, embora não esteja prevista qualquer alteração às taxas de tributação autónoma do IRC, teremos um alargamento do seu campo de incidência, passando-se a aplicar também às viaturas ligeiras de mercadorias referidas no artigo 7.º do Código do Imposto sobre Veículos.
De entre as medidas possíveis a tomar pelas empresas, no sentido de atenuar os efeitos do aumento das taxas de tributação autónoma incidentes sobre viaturas ligeiras de passageiros, o acordo com o trabalhador para a atribuição de veículo como rendimento em espécie será uma delas, que poderá ser negociado sem qualquer alteração salarial que compense o acréscimo de encargos que o trabalhador terá com o IRS e Segurança Social ou, então, com um aumento salarial, de forma a compensar o trabalhador pelo acréscimo de encargos.
Com a opção pela aplicação desta disposição do CIRS, tenderá a ocorrer a transferência da tributação em sede de IRC (através das tributações autónomas), para a tributação em IRS, com rendimentos em espécie na esfera pessoal do trabalhador, das despesas relacionadas com viaturas supramencionadas.
O relatório que acompanhava a Lei do Orçamento do Estado para 2014 refere que o aumento da tributação autónoma incide sobre as viaturas automóveis detidas pelas empresas, como medida que visa assegurar que as viaturas atribuídas aos quadros médios e superiores das empresas sejam consideradas rendimento em espécie em sede de IRS, deixando de ser tributadas ao nível das empresas.
IRS - Enquadramento
São considerados rendimentos do trabalho os provenientes, entre outros, de trabalho por conta de outrem, prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado.
Dispõe a mesma norma que são considerados rendimentos do trabalho dependente as remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal, que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica.
Uma dessas remunerações acessórias está tipificada no n.º 9 da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, que considera rendimentos de trabalho dependente os que cumulativamente cumpram as seguintes condições: que resultem da utilização a título pessoal, pelo trabalhador ou membro de órgão social, de uma viatura automóvel que gere encargos para a entidade patronal, e que exista um acordo escrito entre a entidade patronal e o trabalhador ou membro do órgão social em causa, onde se encontre prevista a utilização para fins pessoais, fora, portanto, do período normal de trabalho.
No caso destas viaturas, aplica-se o n.º 5 do art.º 24.º do CIRS na determinação do valor do rendimento anual a tributar para efeitos de IRS, que corresponde ao produto de 0,75% do valor de mercado da viatura reportado a 1 de Janeiro do ano em causa, pelo número de meses de utilização da referida viatura, ou seja [0,75% x valor de mercado da viatura x número de meses de utilização pessoal].
O valor de mercado da viatura correspondente à diferença entre o valor de aquisição e o produto desse valor pelo coeficiente de desvalorização constante da Portaria n.º 383/2003 de 14 de maio. Da aplicação deste coeficiente nunca poderá resultar um valor inferior a 10% do seu valor de aquisição no ano da matrícula, ou seja, valor de mercado da viatura= valor de aquisição - (Valor de aquisição X coeficiente de desvalorização acumulada). Dado que este acréscimo configura para o trabalhador um rendimento em espécie, não incide retenção na fonte sobre o mesmo, a liquidação do IRS devido será efetuada pela Autoridade Tributária após a entrega da respetiva declaração modelo 3 do ano em causa.
IRC - Enquadramento
No caso de ser celebrado contrato escrito com o trabalhador no decurso do ano, a remuneração em espécie será calculada a partir do mês em que é formalizado esse acordo, sendo tributados autonomamente em IRC os encargos efetuados ou suportados nos meses em que a viatura não se encontre afeta ao trabalhador.
As despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de uma viatura automóvel, que gere encargos para o empregador, tem também acolhimento em sede de Segurança Social, especificamente ao nível do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, que prevê incidência contributiva na alínea s) do n.º 2 do art.º 46.º.
Assim, de acordo com o n.º 1 desse diploma, consideramse remunerações as prestações, pecuniárias ou em espécie que nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem, ou dos usos, são devidas pelas entidades empregadoras aos trabalhadores como contrapartida do seu trabalho, integrando a base de incidência contributiva de acordo com a alínea s), as despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de viatura automóvel que gere encargos para a entidade empregadora. Segundo o n.º 1 do art.º 46.º-A do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, considera-se que a viatura é de uso pessoal sempre que tal se encontre previsto em acordo escrito entre as partes e que do mesmo constem as seguintes especificações, que são cumulativas, nomeadamente: a afetação, em permanência, ao trabalhador, de uma viatura automóvel concreta; os encargos com a viatura e com a sua utilização sejam integralmente suportados pela entidade empregadora; a menção expressa da possibilidade de utilização para fins pessoais ou da possibilidade de utilização durante 24 horas por dia e o trabalhador não se encontre sob o regime de isenção de horário de trabalho Atendendo ao n.º 2 do diploma em referência, considera-se ainda que a viatura é para uso pessoal sempre que, no acordo escrito, seja afeta ao trabalhador, em permanência, viatura automóvel concreta, com expressa possibilidade de utilização nos dias de descanso semanal, pelo que nesta situação nem se terá de cumprir a condição de que os encargos sejam integralmente suportados pela entidade empregadora, para que este rendimento fique sujeito a Segurança Social. A base de incidência contributiva para a Segurança Social corresponde a 0,75 por cento do custo de aquisição da viatura, de acordo com o n.º 4 do art.º 46.º-A do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social. Note-se ainda que o acordo escrito entre empregador e o trabalhador relativo à atribuição de viatura deve respeitar os requisitos constantes do art.º 46.º-A do referido Código, não tendo que ser comunicado, ou enviado, a qualquer entidade.